sábado, 1 de agosto de 2015

Reflexões Mediterrâneas

Com o calmo deslizar de um navio no retorno de Santorini para Atenas, me ponho a refletir.
Serão oito horas de viagem. Duas já se passaram enquanto nos aproximamos de uma parada em Naxos. Na loja a bordo, encontro apenas livros em grego. Minha busca de leitura para passar o tempo não foi frutífera.
Na memória de meu celular recupero um texto enviado por duas autoras da Bahia para o próximo número da Revista Livre de Cinema. Nele, essas mulheres, que não conheço, relatam impressões sobre um projeto de extensão em que exploraram textos e produção cinematográfica de Marguerite Duras para tratar de sublimação, feminilidade e angústias à luz de Freud e Lacan. Os efeitos da leitura sobre mim são múltiplos.
Surpresa foi a primeira emoção. Não sabia da relação tão íntima de Marguerite Duras con o cinema. Hiroshima, mon amour, filme que assisti décadas atrás, é baseado em livro seu. Além disso, descubro que ela fez filmes baseada em romances seus de forma muito criativa. Preciso assistí-los.
Ao chegar ao final do artigo, uma sensação de perplexidade toma conta de mim. Na minha relação com o feminino descubro, pelas palavras das autoras sobre Lacan, que parece haver um outro gozo além do fálico, que foge à minha compreensão, pois nem pela mulher pode ser explicado. Só pode ser sentido. Mas, tampouco posso explicar meu gozo masculino. Posso apenas sentí-lo. O que mais se aproxima de uma explicação para mim é a forma poética com que na língua francesa alguns denominam o orgasmo: petite mort.
Perplexo também fico ao aprender que não existe o feminino no plural, como na sentença "todas as mulheres são loucas". Cada mulher é única! Mas, de qualquer forma, ser únicas não as impede de ser loucas. Loucura e unicidade podem ser qualidades comuns a cada uma delas. Que as feministas me perdoem essa infame piada!
Junto com a perplexidade, o texto me causou um prazer intelectual muito grande. As autoras, em minha opinião, foram muito hábeis na construção do texto que informa e constrói conhecimento ao mesmo tempo. Além de ser informado sobre romances e filmes de Marguerite Duras dos anos 70, aprendo sobre sublimação, angústia, prazer e a mulher. Aprendo, ainda, sobre como usar o cinema em uma atividade de extensão universitária. Um estímulo a mais para colocar em prática um projeto de extensão envolvendo o cinema brasileiro para discutir a formação e atuação de administradores brasileiros. Venho acalentando esta ideia há algum tempo. Parece estar se aproximando do momento da colheita. Está amadurecendo.
Por fim, me invade um sentimento de realização. Compreendo claramente o que David McClelland, nos anos 60 do século passado, quis dizer quando expressou a ideia de necessidade de realização como algo intrínseco ao ser humano.
Criei a Revista Livre de Cinema no ano passado com o objetivo de construir um espaço virtual de disseminação de estudos e reflexões sobre o cinema. Usei a palavra Livre no titulo com uma dupla intenção. Em primeiro lugar, a ideia era que a Revista Livre de Cinema fosse um espaço onde perspectivas e abordagens de análise do tema fossem as mais diversas possíveis. Em segundo lugar, este espaço seria livre porque todo e qualquer texto submetido à Revista Livre de Cinema será publicado sem avaliação de qualidade por quem quer que seja. O juiz da qualidade de cada texto será o eventual leitor.
Até o momento, consegui publicar cinco edições da Revista LIvre de CInema. No conjunto são 30 textos. Para os primeiros números tive que fazer uma busca ativa de autores e textos. Agora, os textos começam a ser submetidos espontaneamente. Aos poucos, a Revista Livre de Cinema vai se consolidando. O texto que li hoje foi uma grata surpresa para mim. Uma indicação de que o caminho será venturoso. Minha visita ao oráculo de Delfos trouxe uma boa profecia!

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