domingo, 22 de novembro de 2015

Leituras ao acaso: textos recentes sobre o cinema brasileiro

Aproveito uma tarde de domingo para descobrir textos publicados em 2015 sobre o cinema brasileiro. Me socorro no Google Acadêmico e encontro uma diversidade de temas e abordagens. 

A primeira leitura traz uma perspectiva histórica sobre o cineasta Silvio Back e seus posicionamentos na relação entre Cinema e Estado à época de lançamento de seus três primeiros filmes: Lance Maior (1968), Guerra dos Pelados (1970) e Aleluia Gretchen (1977). O texto é de Rosane Kaminski, professora da UFPR, assim resumido:

"O texto situa o posicionamento do cineasta Sylvio Back frente às movimentações que marcaram a relação entre cinema e Estado nas décadas de 1960 e 1970. Naquele contexto era visível o desdobramento de um cinema brasileiro politizado e esteticamente “violento”, cujos filmes de baixo orçamento e linguagem renovadora se impunham como forma de oposição ao cinema clássico e mais plenamente industrial. Ao mesmo tempo, ampliava-se o interesse do Estado pela produção cinematográfica em termos empresariais. Durante o regime militar, foram criados órgãos de premiação e fomento ao cinema defendendo a produção de filmes que reforçassem o estatuto industrial do cinema nacional, buscando o aumento de arrecadação nas bilheterias. Em meio a essa situação paradoxal, Sylvio Back estreou na direção de longas-metragens prometendo realizar filmes “sérios” e que se propusessem à comunicação com o público. Para avaliar a inserção desse cineasta nas tensões entre cinema e Estado, são confrontados os depoimentos e entrevistas publicados na imprensa da época e que atestaram publicamente as intenções do cineasta; algumas críticas sobre seus filmes; bem como os filmes de ficção produzidos por Back durante o regime militar, que consistem numa forma de posicionamento do autor perante as questões estéticas e políticas do seu tempo." (Kaminski, 2015, p. 91)

KAMINSKI, R. Sylvio Back nas tensões entre cinema e estado: anos 1960-70. Antíteses, v. 18, n. 15, p. 91-111, 2015.

A segunda leitura vem do campo da educação e aborda a questão do uso do cinema na formação docente inicial e em serviço. Sintetizando experiências brasileiras e argentinas, as autoras indicam razões, motivações, possibilidade e limites do uso do cinema como meio de formação de docentes e posterior uso em sala pelos mesmos:

"O artigo discute questões da educação e cinema na Argentina e Brasil (1990/2010), analisando concepções sobre a formação de professores na interface com o cinema, em projetos e políticas para o magistério. A partir de referenciais teóricos da educação e cinema, realizou-se levantamento e análise de fontes documentais e entrevistas semiestruturadas. Concluiu-se que a exibição e debates de filmes foi a principal estratégia de formação, enfatizando-se aspectos ético-políticos e a prática pedagógica." (Azevedo; Teixeira, 2015, p. 1)

AZEVEDO, A. L. de F. e; TEIXEIRA, I. A. de C. Enlaces entre educação e cinema na Argentina e Brasil (1990-2010). Movimento Revista de Educação, v. 2, n. 2, 2015.

Instigante é a discussão que fazem Rosimeri Silva e Fernanda Ribeiro sobre o convencional e o não convencional na representação dos gays no cinema. Um texto que nos leva de Patrícia Higsmith e seu personagem Tom Ripley até Praia do futuro, o filme de Karin Aïnouz sobre o amor homoafetivo de Donato e Konrad, representações não convencionais dos gays no cinema. Primorosa discussão neste terceiro texto de domingo.

"Este artigo, fundamentado no argumento de Foucault de que nas sociedades do ocidente moderno há a necessidade constante de revelar-se a verdade sobre o sexo, propõe-se a colocar a convencionalidade dos personagens homossexuais no cinema brasileiro em perspectiva com alguns aspectos da biografia e da obra de Patricia Highsmith. A convencionalidade a que nos referimos diz respeito ao imaginário dominante sobre esses personagens que, de forma recorrente, transitam em espaços sociais à margem e apresentam finais infelizes, tendo a morte, a solidão, a punição e/ou a loucura como destinos. Tom Ripley, o principal personagem de Highsmith, destoa desse padrão. Talvez, por isso, a fusão do personagem com sua criadora e as especulações sobre a homossexualidade de ambos sejam, obsessivamente, acionadas pela crítica para explicar tamanha incongruência." (Silva; Ribeiro, 2015, p. 102.

SILVA, R. A. da; RIBEIRO, F. Da convencionalidade dos gays no cinema, a partir de Highsmith e Ripley – “naturezas” não convencionais. Bagoas, n. 12, p. 101-116, 2015.

Encerrando o ciclo de leituras dessa tarde de domingo, coerente com o duplo status do cinema como arte e indústria, encontro um texto de autoria de Inácio Santos Júnior e Carlos Gomes sobre a relação entre captação de recursos para a produção de cinema no Brasil e renda de bilheteria. Um retrato interessante do mercado brasileiro de cinema entre 1995 e 2012. Detalhes no resumo:

"Responsáveis por manter ativa a produção cinematográfica nacional atualmente, as políticas de incentivo ao cinema não garantem um patamar igualitário de captação de recursos para todos os filmes produzidos no país e provocam embates que relacionam a qualidade das produções com o volume de captação bem como levou à criação de um senso comum que afirma que filmes que apresentam uma arrecadação de recursos elevada devem registrar os melhores resultados nas bilheterias. Diante disso, este estudo tem por objetivo analisar a relação entre o volume de recursos captado através de mecanismos de incentivo público e o volume de arrecadação nas bilheterias de filmes brasileiros. Para tanto, foi realizada uma pesquisa descritiva, de caráter documental e com abordagem quantitativa. Os dados utilizados neste estudo dizem respeito a informações referentes à captação de recursos e renda nas bilheterias de 666 filmes nacionais lançados entre os anos de 1995 e 2012, ao passo que a análise estatística empregada foi o coeficiente de correlação de Spearman. Os resultados evidenciaram que existe uma forte correlação positiva entre as duas variáveis analisadas, revelando uma tendência dos filmes com alta captação de recursos serem os que registram as maiores arrecadações nas bilheterias. A análise dos dados revelou ainda que há uma concentração tanto de recursos incentivados (61%) quanto de renda nas bilheterias (75%) em filmes com volume de captação superior a R$ 3 milhões." (Santos Jr; Gomes, 2015, p. 24)

SANTOS JÚNIOR, I. A. N. dos; GOMES, D. A. S. Cinema Brasileiro: Um Estudo Comparativo entre a Captação de Recursos Mediante Mecanismos de Incentivo Público versus a Arrecadação nas Bilheterias Nacionais. Sociedade, Contabilidade e Gestão, v. 9, n. 3, 2014.


domingo, 4 de outubro de 2015

O primeiro filme brasileiro

No livro de Vicente de Paula Araújo, A Bela Época do Cinema Brasileiro, eu havia aprendido que a primeira filmagem feita no Brasil teria ocorrido em 19 de junho de 1898. Esta filmagem foi feita por Afonso Segreto que fora enviado à europa por seu irmão Pascoal Segreto para adquirir um aparelho Lumière.

Hoje, lendo o livro Estado e Cinema no Brasil, de autoria de Anita Simis publicado nesse ano pela Editora Unesp, descubro que José Inácio de Melo Souza descobriu que  o primeiro filme feito no Brasil, com duração de  pouco mais de um segundo, foi obra de José Roberto da Cunha Salles que depositou um pedido de patente em 27 de novembro de 1897 relatando a invenção de um invento denominado "fotografias vivas".

Para quem quiser conferir, eis o link do texto de Souza na Revista USP:

http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/26894/28674

ARAÚJO, V. DE P. A bela época do cinema brasileiro. São Paulo: Perspectiva, 1976.

SIMIS, A. Estado e cinema no Brasil. São Paulo: Editora Unesp, 2015.

domingo, 30 de agosto de 2015

A Volta ao Mundo do Cinema Brasileiro em 80 filmes: 4 - Limite de Mário Peixoto

Encerrando o domingo, acabo de ver em meu computador uma cópia restaurada desse filme lendário de 1931 do qual já ouvira falar, mas achava pouco provável localizá-lo nesse mundo virtual. Dei sorte e encontrei uma restauraçao feita pela Cinemateca Brasileira e Cineteca Bologna concluída em 2010.
Uau! O que dizer dessas quase duas horas de poesia escrita com imagens em movimento? Limite me pareceu um exercício sobre os limites das construções de imagens cinematográficas naquele ano de 1931, Mário Peixoto, seu realizador, usou todos os ângulos possíveis de câmara, todos os enquadramentos possíveis, desde planos gerais até detalhes e closes muito próximos. Também, muitos movimentos de câmaras associados a movimentos de personagens. Fusões e sobreposições. Beleza visual incrível apresentada em um modo completamente distante da narrativa clássica. E a homenagem a Chaplin, nos mostrando a representação de uma sessão de cinema na qual se passava um filme de Carlitos, com direito até a pianista! E as cenas das rodas da locomotiva. Terá sido uma citação da filmagem inaugural do cinema dos irmãos Lumière em 1895?
O filme me pareceu um poema. Poema escrito com imagens muito antes de Buñuel em 1958 e Pasolini em 1965 terem assinalado a possibilidade de um cinema poesia. Mas, esse texto, por enquanto, é apenas o registro inadiável de uma vontade de botar pra fora o que se passou em minha mente quando assistia a Limite. Retornarei a ele outro dia. Preciso saber quem foi esse Mário Peixoto? Que mais fez? O que outros falaram sobre Limite? Será Limite o porto mais longinquo do cinema brasileiro a que chegarei nessa jornada de 80 filmes? Assistir Limite foi quase uma epifânia, quase uma catarse. Esse registro precisava sair de mim, para que o sono pudesse chegar. Retornarei a ele,

A Volta ao Mundo do Cinema Brasileiro em 80 filmes: 3 - Ganga Bruta de Humberto Mauro

Minha primeira reação ao terminar de assistir a esse filme de Humberto Mauro foi: Lindo! Não consegui me conter face ao encanto visual e musical dessa obra prima. Apesar de se tratar de uma versão restaurada pela Cinemateca Brasileira, esse filme de 1933, realizado para a Cinédia de Adhemar Gonzaga, me causou uma impressão forte tanto visualmente quanto em termos sonoros.
Talvez influenciado pela leitura que venho fazendo do livro de Jacques Aumont e Michel Marie – A Análise do Filme – o uso que Humberto Mauro fez de muitos planos detalhes e a articulação entre músicas e espaços cênicos disntintos me chamaram a atenção. A partir de composições de Radamés Gnattali, Humberto Mauro faz uso da música de forma extradiegética compondo diferentes humores visuais e emotivos nos momentos em que o filme se desenrola por espaços tão diversos quanto uma construção, uma igreja, uma taverna, um quarto e jardins, entre outros. São poucas as vezes que a música tem uma função diegética. Em um dos momentos mais marcantes, pelo menos para mim, de Ganga Bruta, ao final do dia, em um grupo de músicos reunidos um deles passa o violão para outro e pede para que ele toque “aquela música de outro mundo”. Essa música vai ser o ponto de partida para um flashback em que Marcos, o protagonista da trama, relembra a tragédia que o fez sair do Rio de Janeiro e ir para Guaraíba supervisionar uma obra de engenharia.
Reproduzo a análise que Lovisi (2010, p. 442) faz do uso da música em Ganga Bruta:
... Ganga Bruta é, em sua maior parte, um filme em que falas e ruídos estão ausentes, o que fez aumentar a importância da trilha musical como ferramenta de auxílio ao drama encenado. No filme de Mauro, a trilha musical aparece em, praticamente, toda a trama e contribuí para a efetivação dos objetivos comunicativos da estória.As composições de Gnattali reafirmam o que é revelado na tela através de uma relação de subordinação da música às imagens. Pelo uso de uma série de recursos musicais herdados principalmente do teatro e da ópera, pode-se compreender parte do processo de criação da obra: cenas tristes recebem música em modo menor, em contraste com o modo maior que aparece em situações alegres, por exemplo. Músicas de andamento ligeiro acompanham cenas de lutas e confusões, numa tentativa constante de ressaltar musicalmente os movimentos físicos das personagens.
No conjunto, em Ganga Bruta se observa a estrutura narrativa clássica dos filmes de Hollywood que havia se tornado um modelo que, já naquela época, se tornava dominante e que segundo Morettin (2007) era o padrão que se via enfatizado na Revista Cinearte e na produtora Cinédia, ambas de propriedade de Adhemar Gonzaga. No entanto, Morettin (2007) argumenta que há nos filmes de Humberto Mauro uma certa resistência ao uso do típico happy end das produções hollywoodianas.

Aliás, nesse mesmo texto Morettin faz uma descrição da trajetória cinematográfica de Humberto Mauro, desde seus primeiros filmes em Cataguases entre 1925 e 1930, primeiro de forma independente e depois para a empresa Phebo Sul America Film, passando em seguida para o período da Cinédia (entre 1930 e 1934), seu longo período como diretor técnico do Instituto Nacional do Cinema, tendo chegado a contribuir em filmes de Nelson Pereira dos Santos e Paulo Cesar Sarraceni nos anos 70 do século passado. Nascido em 1897, veio a falecer em 1983, deixando uma grande produção e reconhecido como “pai” do Cinema Novo por Glauber Rocha (Morettin, 2007, p. 58). Morettin sugeriu que o corpus fílmico que nos legou Humberto Mauro merecia uma análise crítica mais profunda dada a sua diversidade temática e volume de trabalho.
Para mim, conhecer este filme em minha volta ao mundo do cinema brasileiro deixou-me maravilhado em saber que nas raízes do cinema nacional há um Humberto Mauro que Stam e Johnson (1979) qualificaram como o mais importante realizador que surgiu nos anos 20.

Ficha Técnica (retirada de https://www.youtube.com/watch?v=-UHfXmVt1Jk, onde se pode ver o filme)
Observação: Nos crédito do filme Humberto Mauro aparece responsável, também, pela montagem.
GANGA BRUTA, 1933, Rio de Janeiro, RJ.
prd: Adhemar Gonzaga; dir e rot: Humberto Mauro; arg: Octávio Gabus Mendes; fot: Afrodísio de Castro e Edgar Brasil; cam: Paulo Morano; elc: Armando Barreto; crp: Saturnino da Silva; sng: Bechara Jorge; mus: Radamés Gnatalli e Humberto Mauro; clb: Oswaldo Martinez; ext: Ilha das Cobras, RJ; crt: Carlos Eugênio; muf: Ganga bruta, de Heckel Tavares e Joracy Camargo, Teus olhos...água parada, de Radamés Gnatalli, Coco de praia 1 e 2, de Heckel Tavares, todas interpretadas por Moacyr B. Rocha. p&b, 35mm, 85 min, cpr, lab e dis: Cinédia, gen: aventura. 
ELENCO: Durval Belline, Lu Marival, Carlos Eugênio, Déa Selva, Décio Murillo, Andréa Duarte, Alfredo Nunes, Ivan Villar, Francisco Bevilacqua, Renato de Oliveira, João Cardoso, Edson Chagas, Elza Moreno, Mário Moreno, Pery Ribas, Humberto Mauro, Adhemar Gonzaga, Sérgio Barreto Filho, Ayres Cardoso, João Baldi, João Fernandes, Paulo Marra, Olga Silva, Sérgio Barreto, Glória Marina.
SINOPSE: Marcos, rico engenheiro, casa e mata a mulher na noite de núpcias para salvar sua honra. Julgado e perdoado, ele se refugia no interior do país, a pretexto de acompanhar a construção de uma fábrica. Lá encontra Sônia, mocinha alegre e sensual, pela qual se apaixona e, por causa disso, luta contra Décio, o noivo de sua amada. Décio jura vingar-se; Sônia, deflorada por Marcos, suplica a Décio que não o mate. No duelo que se segue, Décio resvala e cai numa cachoeira, afogando-se.

AUMONT, J.; MARIE, M. A Análise do Filme. Lisboa: Edições Texto & Grafia, 2013.

LOVISI, D. M. Radamés Gnattali e a trilha musical no cinema brasileiro. I Simpósio Brasileiro de Pós-Graduandos em Música; XV Colóquio do Programa de Pós-Graduação em Música da UNIRIO (Anais), p. 441-449, Rio de Janeiro, 8 a 10 de novembro de 2010.

MORETTIN, E. Humberto Mauro. Alceu, v. 8, n. 15, p. 48-59, 2007.

STAM, R.; JOHNSON, R. Beyond Cinema Novo. Jump Cut: A Review of Contemporary Media, n. 21, p. 13-18, 1979.

domingo, 9 de agosto de 2015

Andar (n)o mundo procurando belezas

"Andar o mundo procurando belezas". Esta é uma fala de Anita para João no último filme de Jorge Furtado, Real Beleza. Esta frase me impressionou profundamente. Aliás, não é a primeira vez que falas de personagens em filmes assumem um significado especial para mim, inspirando-me alguma reflexão. Só que neste caso, prefiro a frase com um "n" antes de "o mundo". Andar o mundo me passa uma ideia de transitoriedade apressada, apenas passar, sem muito compromisso, a não ser o de realizar uma tarefa. Andar no mundo, ao contrário, significa, ao menos na forma como estou sentindo, o viver no mundo, transitório também, é verdade! Mas, menos apressado, buscando sentir a vida em sua plenitude, com seus altos e baixos, com seus prazeres e dores, com sorrisos e lágrimas... Com um propósito que é muito mais que realizar uma tarefa.
Mas, estou colocando o carro na frente dos bois. Voltemos ao início.
O filme de Jorge Furtado foi lançado no último dia 6. Tive a oportunidade de assistí-lo ontem. A trama, além de Anita e João, envolve Pedro, marido de Anita, e a filha deles, Maria. A sinopse do filme, no Adoro Cinema, conta: "João (Vladimir Brichta) é um fotógrafo decadente, procurando uma nova modelo para relançar a sua carreira. Ele parte para o sul do Brasil, onde fotografa dezenas de adolescentes, até se encantar com a beleza de Maria (Vitória Strada), que deseja transformar em modelo internacional. Mas Pedro (Francisco Cuoco), o pai da garota, se opõe à carreira profissional da filha. Durante uma viagem de Pedro, João tem um caso amoroso com Anita (Adriana Esteves), mãe de Maria." (http://www.adorocinema.com/filmes/filme-224751/). Como toda sinopse, não diz muito, mas serve para revelar parte da trama, preservando o essencial na escuridão. É claro que o filme é mais do que isso!
Fazendo jus ao título, o filme é de uma rara beleza. Há muito não assistia a uma produção brasileira com fotografia tão bela, tanto em interiores quanto exteriores. O roteiro é bem elaborado e conta de forma competente uma trama que envolve conflitos diversos: uma filha adolescente querendo seguir um caminho mais livre; um profissional da fotografia que faz o que não deseja; uma mulher casada com um homem mais velho lutando entre a gratidão e o desejo; o olhar possível e a impossibilidade do olhar...
Tudo isso é narrado por meio de belas imagens usando referências à arte da fotografia e literatura de forma intertextual. Há um diálogo maravilhoso entre Pedro e João, quase ao final do filme, em que um trecho de obra clássica da literatura mundial é usado como uma fala de Pedro. Paro com o spoiler por aqui! O filme me agradou muito. Em alguns momentos, a beleza das imagens era tão intensa que, de forma inusitada para mim, meus olhos marejaram. Cinema cumprindo sua dupla finalidade: entreter e fazer pensar.
A fala de Anita para Jorge, ocorre nos seus primeiros contatos, quando este está lhe dizendo o que faz como fotógrafo. Foi como se um estopim se acendesse e começasse a se queimar em meu cérebro levando a alguma coisa. Na explosão, chego a esse texto.
Mas. como disse, prefiro a forma andar no mundo procurando belezas. Esta fala me fez pensar em minhas andanças no mundo. Não foram tantas quanto eu ainda pretendo, mas já foram algumas. Todas marcantes em algum sentido.
Ao longo de minhas viagens, me habituei a comprar pelo menos um livro da literatura do país que estou visitando. A mais antiga compra de que me lembro foi quando estive em Dublin, há mais de vinte anos atrás. Uma tempestade se avizinhava em minha vida. Não era marítima! Ou seja, não seria na travessia do mar da Irlanda, mas chegaria um dia. Talvez, por isso, a compra desse livro esteja fresca ainda em minha memória. Naqueles dias, comprei em Dublin, o livro Dubliners de James Joyce. Uma coleção de quinze contos publicada em 1914. Mais recentemente, poucos anos atrás, enquanto participava de um congresso em Lima, no aeroporto encontrei na livraria os dois volumes de contos de Julio Ramón Ribeyro intitulados La Palabra del Mudo. Lendo essa coletânea, publicada pela primeira vez em 1973, me emocionei com a histórias contadas por esse escritor peruano. No Brasil, quando estive em Aracaju, pude comprar diversos folhetins de cordel. Uma maneira deliciosa de conhecer a história e o povo de uma localidade.
Em 2015, tive a oportunidade de fazer duas viagens: Montevidéu e Atenas. De cada viagem, além das boas memórias, trouxe um livro. De Montevidéu, mais um livro de contos: Montevideanos de Mario Benedetti. Também, um mestre do texto breve, Benedetti me emocionou com o que li. De Atenas, uma obra prima que estou chegando ao final: Report to Greco de Nikos Kazantzakis. Nessas leituras, encontro algumas belezas dos lugares que visito. Belezas que estão nos livros, estes que são parte da Real Beleza que Jorge Furtado nos trouxe.
Uma coisa me deixou muito incomodado na sala de cinema ontem. Na parte inferior da tela, do lado esquerdo, há um sinal luminoso indicando a saída. Um péssimo local para se preocupar com a segurança da platéia! Muitas vezes, esse sinal luminoso se intrometia nas imagens que eram projetadas. Mas, estava ali indicando um caminho em caso de crise.
Mas, na vida, não temos desses sinais luminosos! Os caminhos são de nossa escolha. Ando no mundo procurando belezas. Seja no cinema, seja na literatura, seja nos estudos da Administração que já fazem parte de minha vida há 38 anos. Tenho encontrado algumas. Felizmente!

sábado, 1 de agosto de 2015

Reflexões Mediterrâneas

Com o calmo deslizar de um navio no retorno de Santorini para Atenas, me ponho a refletir.
Serão oito horas de viagem. Duas já se passaram enquanto nos aproximamos de uma parada em Naxos. Na loja a bordo, encontro apenas livros em grego. Minha busca de leitura para passar o tempo não foi frutífera.
Na memória de meu celular recupero um texto enviado por duas autoras da Bahia para o próximo número da Revista Livre de Cinema. Nele, essas mulheres, que não conheço, relatam impressões sobre um projeto de extensão em que exploraram textos e produção cinematográfica de Marguerite Duras para tratar de sublimação, feminilidade e angústias à luz de Freud e Lacan. Os efeitos da leitura sobre mim são múltiplos.
Surpresa foi a primeira emoção. Não sabia da relação tão íntima de Marguerite Duras con o cinema. Hiroshima, mon amour, filme que assisti décadas atrás, é baseado em livro seu. Além disso, descubro que ela fez filmes baseada em romances seus de forma muito criativa. Preciso assistí-los.
Ao chegar ao final do artigo, uma sensação de perplexidade toma conta de mim. Na minha relação com o feminino descubro, pelas palavras das autoras sobre Lacan, que parece haver um outro gozo além do fálico, que foge à minha compreensão, pois nem pela mulher pode ser explicado. Só pode ser sentido. Mas, tampouco posso explicar meu gozo masculino. Posso apenas sentí-lo. O que mais se aproxima de uma explicação para mim é a forma poética com que na língua francesa alguns denominam o orgasmo: petite mort.
Perplexo também fico ao aprender que não existe o feminino no plural, como na sentença "todas as mulheres são loucas". Cada mulher é única! Mas, de qualquer forma, ser únicas não as impede de ser loucas. Loucura e unicidade podem ser qualidades comuns a cada uma delas. Que as feministas me perdoem essa infame piada!
Junto com a perplexidade, o texto me causou um prazer intelectual muito grande. As autoras, em minha opinião, foram muito hábeis na construção do texto que informa e constrói conhecimento ao mesmo tempo. Além de ser informado sobre romances e filmes de Marguerite Duras dos anos 70, aprendo sobre sublimação, angústia, prazer e a mulher. Aprendo, ainda, sobre como usar o cinema em uma atividade de extensão universitária. Um estímulo a mais para colocar em prática um projeto de extensão envolvendo o cinema brasileiro para discutir a formação e atuação de administradores brasileiros. Venho acalentando esta ideia há algum tempo. Parece estar se aproximando do momento da colheita. Está amadurecendo.
Por fim, me invade um sentimento de realização. Compreendo claramente o que David McClelland, nos anos 60 do século passado, quis dizer quando expressou a ideia de necessidade de realização como algo intrínseco ao ser humano.
Criei a Revista Livre de Cinema no ano passado com o objetivo de construir um espaço virtual de disseminação de estudos e reflexões sobre o cinema. Usei a palavra Livre no titulo com uma dupla intenção. Em primeiro lugar, a ideia era que a Revista Livre de Cinema fosse um espaço onde perspectivas e abordagens de análise do tema fossem as mais diversas possíveis. Em segundo lugar, este espaço seria livre porque todo e qualquer texto submetido à Revista Livre de Cinema será publicado sem avaliação de qualidade por quem quer que seja. O juiz da qualidade de cada texto será o eventual leitor.
Até o momento, consegui publicar cinco edições da Revista LIvre de CInema. No conjunto são 30 textos. Para os primeiros números tive que fazer uma busca ativa de autores e textos. Agora, os textos começam a ser submetidos espontaneamente. Aos poucos, a Revista Livre de Cinema vai se consolidando. O texto que li hoje foi uma grata surpresa para mim. Uma indicação de que o caminho será venturoso. Minha visita ao oráculo de Delfos trouxe uma boa profecia!

quarta-feira, 22 de julho de 2015

A Volta ao Mundo do Cinema Brasileiro em 80 filmes: 2 – Rio, 40 Graus de Nelson Pereira dos Santos

Nessa segunda parada da Volta ao Mundo do Cinema Brasileiro em 80 filmes, viajo ainda mais para o passado do cinema brasileiro. De 1965, com O Padre e a Moça de Joaquim Pedro de Andrade, me vejo às voltas com um dos primeiros filmes de Nelson Pereira dos Santos, Rio, 40 Graus, lançado em 1955, dez anos antes do primeiro longa de Joaquim Pedro de Andrade.
Este filme, que começa com uma panorâmica aérea da cidade do Rio de Janeiro, foi o primeiro longa de Nelson Pereira dos Santos e nele se podem ver retratadas as diferentes classes sociais daquela época do Brasil, em que o Rio de Janeiro era ainda a capital federal. A cidade é a primeira personagem do filme e será o palco de cinco histórias paralelas que culminarão em uma visão que ouso chamar otimista das trajetórias de cada um de seus personagens principais, com exceção de um deles. Para Davi (2004, p. 8) a preocupação de representar o povo, como ele “realmente era”, com seus sonhos, lutas, desejos, aparece claramente no primeiro longa metragem de Nelson...assim como a influência dos cineastas neo-realistas italianos.

Para Pinto (2015), o filme de Nelson Pereira do Santos é um marco na história das representações cinematográficas da cidade do Rio de Janeiro, ao abandonar a imagem de paraíso tropical que vigorava até então, abordando-a de forma mais realista em um diálogo profícuo com o neorrealismo italiano (p. 121).
Embora haja uma visão que tradicionalmente considera os primeiros filmes de Nelson Pereira dos Santos como precursores do Cinema Novo brasileiro, Napolitano (2001) aponta que há diferenças significativas entre esses filmes e as obras cinemanovistas. Para Napolitano (2001, p. 112) há um distanciamento claro entre essas obras e o movimento que explodiu em 1962. Para esse autor, esse distanciamento se dá sobretudo na relação com o público, visto que os filmes de Santos trabalham com elementos musicais e dramáticos ambientados em meios sociais populares, operados por uma linguagem fílmica basicamente realista e narrativa, facilmente assimilável pelo público mais amplo. Na visão de Napolitano, enquanto que os filmes do Cinema Novo apresentam uma linguagem autoral, vanguardista, hermética e o uso de alegorias, os primeiros filmes de Nelson Pereira dos Santos demonstram uma tentativa de fazer um cinema popular e engajado apropriando-se de princípios do cinema comercial da época de forma realista e crítica (p. 112-113).
Em Fabris (2007), surge um questionamento sobre a vinculação estreita entre os dois primeiros filmes de Nelson Pereira do Santos e o neorrealismo italiano. Para a autora,embora haja pontos de ligação de Rio, 40 graus com postulados do neorrealismo, tais como, pobres quase sempre bons e solidários entre si; câmera que segue de perto os personagens; título da fita com três elementos; várias camadas da sociedade, há outras ligações que são relevantes para a compreensão dos primeiros filmes de Nelson Pereira dos Santos. Por exemplo, como a autora enfatiza, uma visão da realidade brasileira bem alinhada com as diretrizes do Partido Comunista Brasileiro; o resgate da cultura popular; e a conscientização do papel histórico a ser desempenhado pela classe trabalhadora. Por fim, a mesma autora resgata uma possível ligação entre este filme de Nelson Pereira dos Santos e Los Olvidados de Buñuel. Em ambos os filmes, os protagonistas são um grupo de meninos da classe mais desfavorecida.
Em entrevista concedida a Paulo Roberto Ramos, Nelson Pereira do Santos, comenta sobre seu primeiro longa: Escrevi o roteiro do Rio, 40 graus, mas não consegui produção, pois ninguém queria fazer um filme com personagens negros na sua maioria. Havia um grande preconceito contra o negro no cinema carioca...Decidi então fazer Rio, 40 graus com recursos próprios. Tive a grande colaboração do Ciro Freire Cury...Era um economista brilhante e ajudou a elaborar o esquema financeiro e econômico do filme. Passado o tempo, ficou a ideia de que aquele filme aconteceu pela vontade de um grupo de garotos loucos. Para dar certo teve, evidentemente, um projeto bem estruturado: a divisão do capital do filme era feita no esquema de cotas, ou seja, a equipe tinha participação na receita...Também vendíamos cotas, e claro que a família foi a primeira a investir: os irmãos, os primos, os amigos...Quando pronto o dono do laboratório mostrou-o para a Columbia, a distribuidora americana, que decidiu comprá-lo. Demoramos nove meses para fazê-lo (RAMOS, 2007, p. 327-328).
Independente de qual seja o vínculo estilístico de Rio, 40 Graus, a impressão que tive ao assisti-lo, antes dessas leituras, foi de um filme que procurava descrever uma realidade social brasileira, de forma crítica, embora não tratasse de como superar a situação desigual retratada nas suas cenas. Sangion (2005, passim) faz uma boa síntese do filme:
O filme de Nelson Pereira dos Santos mostrou o morro, os excluídos, - as alegrias e dissabores dessa gente – fundindo e vinculando a realidade deles com a própria realidade do Rio de Janeiro. De certa maneira, os excluídos era assim, incluídos, contextualizados: eles eram a acidade e a cidade era o morro. Foi uma tentativa de Nelson Pereira de aproximar-se de um universo distinto sem julgamentos pré-concebidos. A favela no morro não aparece fechada em si, mas em contato com os resto da cidade. Assim como a música-tema do filme (Eu sou o samba,a voz do morro sou eu mesmo sim senhor...), Rio, 40 graus deu voz ao morro literalmente.
Mas, para mim, mas ao fazer essa fusão de realidades, Nelson Pereiera dos Santos evidenciou uma desigualdade de condições de vida e uma concentração de poder nos mais abastados que me fez lembrar do sucesso de Elis Regina de minha adolescência. Naquela época, como agora, nós somos os mesmos e vivemos como nossos pais. Me parece que o Brasil pouco mudou nesses 60 anos.
Ficha Técnica:
Direção: Nelson Pereira dos Santos
Roteiro: Nelson Pereira dos Santos
Produção: Nelson Pereira dos Santos, Mário Barros, Ciro Freire Cúri, Luiz Jardim, Louis Henri Guirron e Pedro Kosinski
Assistente de Direção: Jece Valadão
Fotografia: Hélio Silva
Montagem: Rafael Justo Valverde
Música: Radamés Gnatalli
Elenco: Jece Valadão. Glauce Rocha, Roberto Bataglin, Zé Kéti, Sady Cabral, Mauro Mendonça, Renato Consorte, Ana Beatriz, Claudia Morena, Modesto de Souza.

Referências:

DAVI, T. N. Nelson Pereira dos Santos e o Cinema Brasileiro. Cadernos da Fucamp, v. 3, n. 3, p. 1-22, 2004.
FABRIZ. M. A Questão Realista no Cinema Brasileiro: aportes neorealistas. Alceu, v. 8, n. 15, p. 82-95, 2007.
NAPOLITANO, M. A Arte Engajada e seus Públicos (1955/1968). Estudos Históricos, n. 28, p. 103-124, 2001.
PINTO, C. E. P. de Rio. 40 Graus A disputa pela Imagem da Capitaldo Brasil nos Anos Dourados. Acervo, v. 28, n. 1, p. 120-131, 2015.
RAMOS, P; R. Nelso Pereira dos Santos: Resistência e Esperança de um Cinema Brasileiro. Estudos Avançados, v. 21, n. 59, p. 323-346, 2007.
SANGION, J. Realismo e Realidade no Cinema Brasileiro – De Rio, 40 Graus a Cidade de Deus. Caligrama Revista de Estudos e Pesquisas em Linguagem e Mídia, v. 1, n. 3, 2015.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

A Volta ao Mundo do Cinema Brasileiro em 80 filmes: 1 - O Padre e a Moça de Joaquim Pedro de Andrade

Tudo começou no primeiro domingo de julho de 2015. Ao despertar de uma breve soneca, ao final da tarde, ligo a TV e sintonizo no Canal Brasil em busca de algo interessante para assistir. Pego o CineJornal a meio caminho. Logo depois, começa mais uma sessão do É tudo Verdade, apresentado por Amir Labaki. O documentário do dia é Mário Lago dirigido por Marco Abujamra e Markão Oliveira.
Na minha juventude havia lido Na Rolança do Tempo, livro autobiográfico desse homem brasileiro que exerceu tantos papéis: ator, escritor, compositor, ativista político, entre outros. No documentário aprendo que Mário Lago atuou em um filme de Joaquim Pedro de Andrade lançado em 1965, O Padre e a Moça. No primeiro longa-metragem de Joaquim Pedro de Andrade, Lago fez o papel de Honorato, o “dono” da moça que faz parte do título e, também, comerciante que prendia os últimos garimpeiros a dívidas que nunca se acabavam com a venda da pequena cidade onde se narra a história. Duplamente explorados pelo esgotamento do garimpo e pelo esquema monopolista de compra dos diamantes montado por Honorato. A ficção reproduzindo a realidade que o próprio Mário Lago, em entrevista publicada no número 42 da Contracampo Revista de Cinema, informaria ter sido encontrada na figura de um comerciante local. Nas palavras do ator:
“E um dia chega um garimpeiro, que aparece no filme, pra vender uma pedra. Fomos nos aproximar pra ver realmente como era, que é a coisa mais fria do mundo... O garimpeiro não sabe o valor do ponto, não sabe quantos pontos tem a pedra. E o garimpeiro está preso ali na venda, devendo sempre, ele compra ali óleo, feijão, compra tudo. Então era aquilo: "Tem tantos pontos... Vale tanto, você estava devendo tanto, passa a dever tanto... Quer levar mais alguma coisa?" O interesse dele é que o garimpeiro sempre fique preso a ele. Eu nunca tinha visto isso. Eu conhecia de ler...”
O pequeno trecho do filme mostrado no documentário chama minha atenção. Foi feito em preto e branco! Minha curiosidade fica aguçada e vou fuçar a internet atrás do filme. Consigo localizar um trecho de 44 minutos que assisto na mesma noite. Mas, queria ver o filme todo. Que fazer? Tento localizar um torrent do filme e sou bem sucedido. Serão pelo menos três horas de download! 
Enquanto isso, busco informações sobre o poema O Padre, A moça de Drummond no qual o outro Andrade se inspirou. Ou, como registrado no começo do filme – “sugerido pelo poema O Padre, A Moça de Carlos Drummond de Andrade”. Localizo um texto publicado na revista Via Atlântica, número 15, de 2010. Neste texto, Ivan Marques explora a relação poética entre o poema e o filme. Nesse momento, me inspiro: vou fazer uma viagem ao mundo do cinema brasileiro apoiado em escritos sobre filmes brasileiros; assistir filme, ler texto, refletir, escrever; assistir, ler, refletir, escrever; assistir, ler, refletir, escrever... Imediatamente vem á mente o título, inspirado em Júlio Verne, essa será uma viagem longa! Oitenta filmes, começando por um de 1965.
Obviamente influenciado pelo começo do filme, espero encontrar um filme-poesia. Não me decepciono. Ritmo lento, silêncios, panorâmicas e planos médios, poucos diálogos, a câmara, de vez em quando, acompanha o movimento dos personagens. Alguns planos seqüências curtos na primeira parte, depois bem longos na fuga do padre e da moça. Cinco atores profissionais e figurantes que são parte da pequena população de uma cidade decadente que viveu o auge do ciclo do ouro de Minas Gerais – São Gonçalo do Rio das Pedras, próximo a Diamantina. A beleza e juventude de Helena Ignez e Paulo José, em seu primeiro filme, são contrapostas à velhice e decadência da cidade e dos figurantes. O uso de planos detalhes é quase nulo, mas quando feito revelam uma poesia insuperável. Impossível deixar de admirar a aproximação da boca do Padre (Paulo José) à pele do ombro da Moça (Helena Ignez). Momento em que os personagens se rendem ao amor e superam a repressão do proibido. Pois é, o filme é uma história de amor impossível!

Fonte: www.contracampo.com,br
Fonte: www.contracampo.com,br



Só isso? Não! É, também, um registro desapaixonado, cru, mas dolorido da desigualdade e exploração de muitos por poucos. E, também, da intolerância com aqueles que se rebelam com a tradição.
Nessa primeira parada dessa viagem, encontro material riquíssimo. No texto de Marques, mencionado acima descubro que o poema de Drummond foi publicado pela primeira vez em 1962 no livro Lição de coisas. Para Marques, “nesse momento de inquietação política, o filme e o poema partilham a circunstância de serem obras aparentemente formalistas e até mesmo alienadas, ao passo que exprimem, na verdade, uma forte inclinação para o conhecimento da realidade brasileira” (p. 89). 
Em outro texto, João Manuel dos Santos Cunha usa a transcriação do poema de Drummond realizada por Joaquim Pedro de Andrade para abordar as afinidades poéticas entre o cinema e a literatura. Para este, o primeiro longa-metragem de Andrade é consistente com outros encontros do cinema com a poesia em que “a poesia prolonga sua exploração estética no cinema; e o cinema recebe a unção da poesia na busca e na definição de sua especificidade estética” (p. 107). É na intersecção das textualidades poética e fílmica de O padre, a moça de Carlos Drummond de Andrade e O padre e a moça de Joaquim Pedro Andrade que se evidencia a “permanência da poesia na tradução do literário ao fílmico, possibilitada pela vontade de cinema na literatura e pelo desejo de literatura no cinema” (p. 123).
Na mesma edição da Contracampo publicada em 2002, já mencionada, encontro um conjunto de textos e entrevistas sobre o filme de Joaquim Pedro de Andrade. No próprio Editorial, Ruy Gardnier comentou que o filme que fora “considerado “deslocado” do problema central na época do cinema novo nos surge agora como uma das peças mais brilhantes produzidas no período”. O filme passara por uma completa restauração em trabalho liderado por Alice de Andrade, filha do cineasta. Joaquim Pedro de Andrade faleceu em setembro de 1988.
Entre os textos da Contracampo, ressalto o comentário de Luciana Araújo que ao tentar responder à pergunta “O que faz um filme poético?” observa que O Padre e a Moça, como um poema, também “tem suas rimas, associações visuais recorrentes que vão compondo contrastes e relações entre preto/branco, claro/escuro, pele/pedra, deslocamento/imobilidade”. Em outro texto, Luís Alberto Rocha Melo ao chamar a atenção para a dupla orientação do filme, como apontei acima, uma história de amor acompanhada de crítica social, reforça a percepção de filme-poesia nesse comentário: “não se prendendo ao drama amoroso, o filme também não cai, em momento algum, na síntese sociológica. É, portanto, um filme muito pouco "consumível", e neste sentido, essencialmente poético”. Mais ao final do texto, Rocha conclui que “O Padre e a Moça fala, portanto, de uma incapacidade de superar certos entraves sociais e morais essencialmente subdesenvolvidos. As saídas podem ser a loucura, a morte, o confinamento ou a fuga. Mas a estagnação está dentro e fora dos personagens, e define, tristemente, um modo de ser. Esta ligação estabelecida pelo filme entre o drama amoroso e a tragédia social ganha especial colorido em O Padre e a Moça e é, até hoje, tema raro em filmes brasileiros”.
Entre as entrevistas que integram essa edição da Contracampo, a de Paulo José ilumina um aspecto que ajuda a entender as escolhas de planos de filmagem do Joaquim Pedro de Andrade ao fazer seu primeiro longa. Em entrevista concedida a Clara Linhart, Camila Maroja e Daniel Caetano, o ator comentou que “o Joaquim achava obsceno fazer um plano fechado com um ator fazendo uma grande careta. Quanto mais a câmera se aproximava, mais econômico você tinha que ser. O filme tem poucos closes, porque o close up é um questão moral também. O close-up é muita responsabilidade no cinema, você não chega e põe impunemente um cara com um rosto de 5 metros diante de você, isso tem que ser muito significativo. E o Joaquim sabia bem disso... E o Joaquim é exemplar. O plano de detalhe, para ele, é assim, olhou o relógio, aí cortou pra close no pulso com relógio? Só se esse relógio for a coisa mais importante do filme! Tudo que se conta nesse ponteiro de relógio tem que ser absolutamente, quando bate meio-dia, alguma coisa que, plan!, o relógio do tamanho da tela... Porque dar um detalhe do cara olhando o relógio não tem sentido. O cinema usa muito o recurso do plano de detalhe, até para criar passagens, criar descontinuidade, para o Joaquim isso era inconcebível”.
Nessa fala de Paulo José, encontro a explicação para a importância do plano detalhe da boca do padre se aproximando da pele da moça. Era um dos momentos mais significativos do filme!
Mas, preciso encerrar esse primeiro trecho da viagem e partir para o próximo. Abaixo estão as referências mencionadas, precedidas pela composição da equipe técnica do filme conforme apresentado por Daniel Caetano no número 42 da Revista Contracampo;

Equipe Técnica do filme O Padre e a Moça: 

Joaquim Pedro de Andrade, diretor, roteirista e produtor; Mário Carneiro, fotógrafo, cenógrafo e câmera; Eduardo Escorel, assistente de direção e montador; Fernando Duarte, assistente de câmera e fotógrafo still; Raimundo Higino, diretor de produção; Carlos Alberto Prates Correa, continuísta; Flávio Werneck e Geraldo Veloso, estagiários de produção; Carlos Lyra, compositor da trilha; Guerra Peixe, orquestrador; Quinteto Villa-Lobos, execução da trilha; Luiz Carlos Barreto, produtor associado. O elenco era formado por Paulo José, Helena Ignez, Mário Lago, Fauzi Arap e Rosa Sandrini.

Referências:
ARAÚJO, L. O Padre, a Moça e Joaquim Pedro. Contracampo Revista de Cinema, n. 42, 2002, disponível em http://www.contracampo.com.br/42/frames.htm
CAETANO, D. A partir de O Padre e a Moça – uma investigação. Contracampo Revista de Cinema, n. 42, 2002, disponível em http://www.contracampo.com.br/42/frames.htm.
CUNHA, J. M. dos S. Afinidades poéticas: a vontade de cinema na literatura, o desejo de literatura no cinema. Revista Anpoll, v. 1, n. 30, p. 103-125, 2011.
GARDNIER, R. Editorial. Contracampo Revista de Cinema, n. 42, 2002, disponível em http://www.contracampo.com.br/42/frames.htm.
LINHART, C.; MAROJA, C.; CAETANO, D. Entrevista com Mário Lago. Contracampo Revista de Cinema, n. 42, 2002, disponível em http://www.contracampo.com.br/42/frames.htm.
LINHART, C.; MAROJA, C.; CAETANO, D. Entrevista com Paulo José. Contracampo Revista de Cinema, n. 42, 2002, disponível em http://www.contracampo.com.br/42/frames.htm.
MARQUES, I. O padre, a moça e um “brasileiro mistério” – Drummond nas lentes do cinema novo. Via Atlântica, n. 15, p. 87-99, 2009.
MELO, L. A. R. O Padre e a Moça. Contracampo Revista de Cinema, n. 42, 2002, disponível em http://www.contracampo.com.br/42/frames.htm.

domingo, 19 de abril de 2015

Craca de Leite

Tem coisas que grudam na gente. São que nem craca de leite que vai se pegando na vasilha onde é fervido. Lava-se, lava-se, lava-se... Quando você pensa que conseguiu tirar tudo, enxágua a vasilha e pronto! Que nada! Ainda tem vestígio dela. Mais umas esfregadas. Pode ser que agora tenha saído, mas se a vista falha, alguma marquinha ficou.

Nossa vida é longa. Graças aos avanços da medicina, cada vez mais longa. Nascemos enrugados, mas, aparentemente, sem marcas definitivas. Logo depois do parto, após o primeiro banho, estamos limpinhos. Prontos para enfrentar os anos que vêm pela frente. De pele e mente preparadas para aquilo que o destino vai tentar grudar em nós. No meu caso, me aproximo dos 58 anos. Parece muito, mas ainda não me dei por satisfeito. Apesar de tantas cracas que tive que ir limpando, areando da vida, quero mais. Preciso de mais!

Ontem recebi pelo Facebook um link que me levou aos meus vinte anos. Uma viagem no tempo com a ajuda da memória coletiva. Quem me conhece, sabe que desde a adolescência, ir ao cinema faz parte de meu modo de entender o mundo. Ainda criança, troquei as idas dominicais à igreja pelas matinês do Cine Augustus da Londrina do final dos anos 60 e começo dos 70 do século passado. Hoje, depois de tantos anos, me dou conta que troquei uma fantasia por outra. A religião não me motivava, mas as idas ao cinema mexiam comigo. Me faziam pensar.

Muitas marcas surgiram nas salas escuras dos cinemas de minha vida. O primeiro exercício de autonomia – ainda criança ir sozinho ao cinema; a primeira namorada, que depois se tornou minha esposa, Telma, mãe de Paloma e Fernanda. Hoje somos bons amigos. Ver 1900, de Bertolucci, e depois refletir sobre o filme para escrever um trabalho da disciplina de sociologia. Terezinha Giovenazzi, irmã do ator Edney Giovenazzi, foi a professora que causou esta marca! Me dou conta hoje que deveria ter agradecido a ela a tarefa tão inspiradora! Uma boa craca que ajudou a tornar o cinema parte de meu modo de compreender o mundo e a vida.

O primeiro filme pornô, depois que acabou a censura no Brasil. O desejo por Dina Sfat (Macunaíma), Lilian Lemertz (Lição de Amor) e Helena Ramos (Mulher Objeto) que brilhavam nos filmes brasileiros de minha juventude! Teve também a Vera Fischer (Amor, Estranho Amor), mas dessa a Sara não gosta muito que eu fale. Não sei por que? As emoções dos filmes de Chaplin, as lágrimas inevitáveis em alguns dramalhões. A raiva com algumas porcarias.

Se você ainda não adivinhou, o link que recebi tem a ver com o cinema. É claro! É a digitalização das edições da Revista Cinema em CloseUp, publicada entre 1975 e 1979 (http://portalbrasileirodecinema.com.br/cinemaemclose…/indice). Documento histórico de valor inestimável que me fez lembrar muitas idas ao cinema. Esse é um tipo de craca que não quis nunca limpar! Muitos dos filmes que estão retratados nas edições da Cinema em Closeup fazem parte de minha trajetória pelo mundo das imagens e significados. Algum amigo mais sacana, vai dizer que chegaram a deixar calos nas mãos! Mas, não é só por isso...

Comecei esse texto, com um tom sombrio! Parecia que ia falar de coisas negativas, pois afinal, craca tem um som meio ruim, agressivo, não? Mas, as cracas que machucam, que doem, acabaram ficando de lado neste texto. Elas existem, mas estão em algum cantinho onde passam desapercebidas. Me ajudaram a compreender o mundo, mas deixa elas pra lá! O melhor é poder lembrar de cracas que, apesar dos esfregões da vida, conseguiram deixar sua boa marca na minha história. Vida longa a todos!

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

20 anos de cinema brasileiro: as dinâmicas de realização, produção e distribuição

Com o final de 2014, completaram-se 20 anos de crescimento da produção cinematográfica brasileira exibida em salas de cinema. Como levantamentos iniciais de um projeto de pesquisa em que atuarei durante 2015 e parte de 2016, aproveito a folga de Carnaval para finalizar um a análisepreliminar dos dados anuais dos lançamentos de filmes brasileiros que estão disponíveis no site da ANCINE (www.ancine.gov.br).

Nessas duas décadas, passamos de quatorze filmes lançados em 1995 para 114 em 2014. Ou seja, em vinte anos o lançamento de filmes brasileiros na primeira janela de exibição cresceu oito vezes. Em 2013 tivemos o ápice desse crescimento quando foram lançados 129 filmes. No total foram 1.123 lançamentos que tiveram um público de cerca de 234,5 milhões de pessoas. De novo, quando se compara 1995 com 2014, vê-se que o crescimento de público foi de quase cinco vezes, passando de 3,3 milhões para 16,0 milhões. 2010 foi o ano em que o cinema brasileiro obteve o seu maior públicos, 24,5 milhões de ingressos foram vendidos.

Os dados revelaram que 772 diretores conseguiram exibir pelo menos um filme no período. Um dado impressionante é que 540 realizadores, praticamente 70%, conseguiram exibir apenas um filme nesses vinte anos. Outros 212 (27,5%) exibiram entre dois e cinco filmes. Por fim, apenas vinte realizadores conseguiram acesso ao mercado exibidor para seis filmes ou mais. Evaldo Mocarzel e Moacyr Góes são os realizadores mais bem sucedidos, em termos de filmes exibidos, com treze e dez, respectivamente.

A façanha de ser exibido no mercado de cinema brasileiro não é fácil para os realizadores brasileiros. O mercado é amplamente dominado pela cinematografia de Hollywood. Por exemplo, em 2013, foram exibidos 200 títulos dos EUA e 167 do Brasil. Em termos de títulos, Os EUA ficaram com 34,8% e o Brasil com 29,1%. Mas, no que diz respeito a publico e bilheteria, a participação dos EUA foi de 77,9% e 79,5%, respectivamente, enquanto que para os filmes brasileiros os número foram de 18,6% e 16,9%.

Um outro aspecto que chamou atenção na análise dos dados, diz respeito ao fenômeno da codireção. Apenas 133 filmes foram dirigidos por dois ou mais realizadores. Essa prática foi mais frequente para os documentários (70 casos), enquanto que no gênero de ficção foram 56 filmes. Completam esses dados sete filmes de animação realizados em codireção. Parece, também, que esta prática é fenômeno recente na realização cinematográfica brasileira, pois 60% desses filmes, isto é, 80 foram lançados entre 2009 e 2014.

No que diz respeito à produção, os dados revelam uma situação parecida com a vista na realização. O mercado produtor de cinema brasileiro é altamente fragmentado. Os registros da ANCINE revelaram a existência de 611 produtoras, incluindo pessoas jurídicas e físicas, das quais 400 (65,5%) fizeram a produção de apenas um filme. Um número reduzido de empresas conseguiu lançar dez ou mais filmes no mercado exibidor, conforme se nota na tabela abaixo:
Produtora
Período
Filmes lançados
Conspiração Filmes
1998-2014
29
Videofilmes
1995-2014
29
Diler & Associados
1999-2013
28
O2 Cinema
2001-2014
19
Globo Comunicação
2013-2014
18
Dezenove Som e Imagens
1995-2014
17
Filmes do Equador
1995-2013
17
Tambellini Filmes
1999-2013
12
TV Zero Cinema
1998-2014
12
Canal Brazil
2009-2014
11
Lereby Produções
1999-2014
11
Total Entertainment
2002-2013
11
Gullane Filmes
2004-2012
10

Entre essas produtoras, há três que lançaram filmes no mercado desde 1995, considerado o ano da retomada: Videofilmes, Filmes do Equador e Dezenove Som e Imagens. Outras lançaram filmes a partir do final dos anos 90. Mas, há dois casos que chamam a atenção: Globo Comunicação e Canal Brazil que nesse vinte anos, entraram tardiamente no mercado produtor, a primeira somente em 2013, e a segunda em 2009.

A entrada dessas duas produtoras parece estar ligada ao crescimento da coprodução no cinema brasileiro. Entre os mais de mil e cem filmes lançados no mercado nessas duas décadas, apenas 97 foram produzidas em parcerias com duas ou mais produtoras. Desses 97 filmes, 73 lançamentos ocorreram em 2013 e 2014. Além disso, todos os filmes com a participação da Globo Comunicação foram coproduções e nove dos produzidos pela Canal Brazil também foram coproduções. Por fim, entre as produtoras da tabela, apenas a Diler & Associados não lançou nenhum filme coproduzido nesses vinte anos.

A situação da distribuição da produção cinematográfica brasileira para as salas de cinema revelou um quadro semelhante ao da produção. Isto é, esse mercado é, também, muito fragmentado, com a presença de 203 empresas, das quais 118 distribuíram apenas um filme. No entanto, o mercado distribuidor de filmes brasileiros parece ser mais competitivo. Isso ocorre porque há a presença de um número elevado de empresas com participação de mercado igual ou maior que vinte filmes, conforme exposto na tabela abaixo.

Distribuidora
Período
Filmes distribuídos
RioFilme
1995-2013
197
Downtown
2006-2014
72
Espaço Filmes
2009-2014
45
Vitrine Filmes
2010-2014
42
Paris
1995-2014
41
Columbia
1996-2005
38
Fox
1999-2014
37
Pandora
1999-2012
35
Imovision
2003-2012
34
Videofilmes
2003-2013
33
Warner
1999-2014
33
Europa
2003-2013
32
Polifilmes
2005-2014
31
Imagem
2003-2013
26
Sony
2006-2013
21
Filmes do Estação
2006-2011
20
Lumière
1997-2004
20
Pipa
2005-2014
20

Como se pode observar, a campeão do mercado distribuidor foi a RioFilme com 197 filmes distribuídos. Mas, estranhamente em 2014 essa empresa não marcou presença na distribuição. O mercado distribuidor conta com a participação das chamadas Majors, distribuidoras multinacionais, entre as quais estão na lista: Columbia, Fox, Warner e Sony. Quatro empresas estão no mercado desde os momentos iniciais da Retomada: RioFilme, Paris, Columbia e Lumière. Mas, as duas últimas deixaram de distribuir filmes em 2005 e 2004, respectivamente. Por fim, no que diz respeito à distribuição, há empresas que entraram mais recentemente no mercado e já se tornaram grandes atores da distribuição de filmes. Encontram-se nessa situação, a Downtown com filmes distribuídos a partir de 2006, a Espaço Filmes desde 2009 e a Vitrine Filmes desde 2010. Note-se que estas três empresas estão abaixo apenas da RioFilme em termos de número de filmes distribuídos.

Chegando ao fim desse post, que já está longo para o canal, busquei uma forma de olhar mais detalhadamente as três dinâmicas que abordei de forma integral no período de 1995 a 2014. Um olhar mais detalhado nos dados revelou que as dinâmicas de realização, produção e distribuição parecem ter evoluído por um conjunto de quatro períodos, com durações distintas, que estou batizando de:
  • Tímido recomeço: 1995 a 1998
  • Crescendo com a ficção: 1999 a 2003
  • Documentário e animação se embalam: 2004 a 2008
  • Tempo de parcerias: 2009 a 2014
Basicamente, cada um desses períodos tem movimentos distintos de realização, produção e distribuição que permitem sua diferenciação. Analisar de forma aprofundada esses períodos será objeto do projeto de pesquisa que mencionei no começo desse post. Mas, para ilustrar as diferenças, nas próximas quatro tabelas estão apresentados os dados de número de filmes, público e renda de cada um dos períodos.

1º. Período – Tímido recomeço:
ANO
FILMES
FICÇÃO
DOCUMENTÁRIO
PÚBLICO
RENDA (R$)
1995
14
12
2
3.278.508
14.681.088,00
1996
18
17
1
1.070.852
4.742.154,00
1997
21
19
2
3.750.913
16.564.437,00
1998
23
21
2
4.330.557
18.616.704,00
Total
76
69
7
12.430.830
55.604.383,00


2o. Período: Crescendo com a ficção:
ANO
FILMES
FICÇÃO
DOCUMENTÁRIO
ANIMAÇÃO
PÚBLICO
RENDA (R$)
1999
28
24
4

6.092.779
25.261.991,00
2000
23
20
3

6.344.669
31.610.071,00
2001
30
21
8
1
7.948.065
40.475.909,00
2002
29
19
10
0
7.170.334
39.322.601,00
2003
30
26
4
0
22.291.806
135.329.180,00
Total
140
110
29
1
49.847.653
271.999.752,00


3º. Período – Documentário e Animação se embalam:
ANO
FILMES
FICÇÃO
DOCUMENTÁRIO
ANIMAÇÃO
PÚBLICO
RENDA (R$)
2004
49
33
15
1
15.494.873
102.287.154,00
2005
46
30
15
1
10.178.327
71.545.259,00
2006
71
47
24
0
10.758.146
78.776.626,00
2007
78
44
32
2
9.484.908
73.977.706,00
2008
79
53
25
1
8.617.003
66.080.770,00
Total
323
207
111
5
54.533.257
392.667.515,00

4º. Período – Tempo de parcerias:
ANO
FILMES
FICÇÃO
DOCUMENTÁRIO
ANIMAÇÃO
PÚBLICO
RENDA (R$)
2009
84
44
39
1
17.286.617
141.036.700,00
2010
74
43
31
0
24.464.112
218.031.092,00
2011
100
57
42
1
17.579.309
161.843.685,00
2012
83
47
34
2
19.744.268
200.590.667,00
2013
129
77
51
1
23.624.704
253.982.442,00
2014
114
74
36
4
15.978.458
187.153.637,00
Total
610
332
233
9
118.677.468
1.162.638.223,00