domingo, 22 de novembro de 2015

Leituras ao acaso: textos recentes sobre o cinema brasileiro

Aproveito uma tarde de domingo para descobrir textos publicados em 2015 sobre o cinema brasileiro. Me socorro no Google Acadêmico e encontro uma diversidade de temas e abordagens. 

A primeira leitura traz uma perspectiva histórica sobre o cineasta Silvio Back e seus posicionamentos na relação entre Cinema e Estado à época de lançamento de seus três primeiros filmes: Lance Maior (1968), Guerra dos Pelados (1970) e Aleluia Gretchen (1977). O texto é de Rosane Kaminski, professora da UFPR, assim resumido:

"O texto situa o posicionamento do cineasta Sylvio Back frente às movimentações que marcaram a relação entre cinema e Estado nas décadas de 1960 e 1970. Naquele contexto era visível o desdobramento de um cinema brasileiro politizado e esteticamente “violento”, cujos filmes de baixo orçamento e linguagem renovadora se impunham como forma de oposição ao cinema clássico e mais plenamente industrial. Ao mesmo tempo, ampliava-se o interesse do Estado pela produção cinematográfica em termos empresariais. Durante o regime militar, foram criados órgãos de premiação e fomento ao cinema defendendo a produção de filmes que reforçassem o estatuto industrial do cinema nacional, buscando o aumento de arrecadação nas bilheterias. Em meio a essa situação paradoxal, Sylvio Back estreou na direção de longas-metragens prometendo realizar filmes “sérios” e que se propusessem à comunicação com o público. Para avaliar a inserção desse cineasta nas tensões entre cinema e Estado, são confrontados os depoimentos e entrevistas publicados na imprensa da época e que atestaram publicamente as intenções do cineasta; algumas críticas sobre seus filmes; bem como os filmes de ficção produzidos por Back durante o regime militar, que consistem numa forma de posicionamento do autor perante as questões estéticas e políticas do seu tempo." (Kaminski, 2015, p. 91)

KAMINSKI, R. Sylvio Back nas tensões entre cinema e estado: anos 1960-70. Antíteses, v. 18, n. 15, p. 91-111, 2015.

A segunda leitura vem do campo da educação e aborda a questão do uso do cinema na formação docente inicial e em serviço. Sintetizando experiências brasileiras e argentinas, as autoras indicam razões, motivações, possibilidade e limites do uso do cinema como meio de formação de docentes e posterior uso em sala pelos mesmos:

"O artigo discute questões da educação e cinema na Argentina e Brasil (1990/2010), analisando concepções sobre a formação de professores na interface com o cinema, em projetos e políticas para o magistério. A partir de referenciais teóricos da educação e cinema, realizou-se levantamento e análise de fontes documentais e entrevistas semiestruturadas. Concluiu-se que a exibição e debates de filmes foi a principal estratégia de formação, enfatizando-se aspectos ético-políticos e a prática pedagógica." (Azevedo; Teixeira, 2015, p. 1)

AZEVEDO, A. L. de F. e; TEIXEIRA, I. A. de C. Enlaces entre educação e cinema na Argentina e Brasil (1990-2010). Movimento Revista de Educação, v. 2, n. 2, 2015.

Instigante é a discussão que fazem Rosimeri Silva e Fernanda Ribeiro sobre o convencional e o não convencional na representação dos gays no cinema. Um texto que nos leva de Patrícia Higsmith e seu personagem Tom Ripley até Praia do futuro, o filme de Karin Aïnouz sobre o amor homoafetivo de Donato e Konrad, representações não convencionais dos gays no cinema. Primorosa discussão neste terceiro texto de domingo.

"Este artigo, fundamentado no argumento de Foucault de que nas sociedades do ocidente moderno há a necessidade constante de revelar-se a verdade sobre o sexo, propõe-se a colocar a convencionalidade dos personagens homossexuais no cinema brasileiro em perspectiva com alguns aspectos da biografia e da obra de Patricia Highsmith. A convencionalidade a que nos referimos diz respeito ao imaginário dominante sobre esses personagens que, de forma recorrente, transitam em espaços sociais à margem e apresentam finais infelizes, tendo a morte, a solidão, a punição e/ou a loucura como destinos. Tom Ripley, o principal personagem de Highsmith, destoa desse padrão. Talvez, por isso, a fusão do personagem com sua criadora e as especulações sobre a homossexualidade de ambos sejam, obsessivamente, acionadas pela crítica para explicar tamanha incongruência." (Silva; Ribeiro, 2015, p. 102.

SILVA, R. A. da; RIBEIRO, F. Da convencionalidade dos gays no cinema, a partir de Highsmith e Ripley – “naturezas” não convencionais. Bagoas, n. 12, p. 101-116, 2015.

Encerrando o ciclo de leituras dessa tarde de domingo, coerente com o duplo status do cinema como arte e indústria, encontro um texto de autoria de Inácio Santos Júnior e Carlos Gomes sobre a relação entre captação de recursos para a produção de cinema no Brasil e renda de bilheteria. Um retrato interessante do mercado brasileiro de cinema entre 1995 e 2012. Detalhes no resumo:

"Responsáveis por manter ativa a produção cinematográfica nacional atualmente, as políticas de incentivo ao cinema não garantem um patamar igualitário de captação de recursos para todos os filmes produzidos no país e provocam embates que relacionam a qualidade das produções com o volume de captação bem como levou à criação de um senso comum que afirma que filmes que apresentam uma arrecadação de recursos elevada devem registrar os melhores resultados nas bilheterias. Diante disso, este estudo tem por objetivo analisar a relação entre o volume de recursos captado através de mecanismos de incentivo público e o volume de arrecadação nas bilheterias de filmes brasileiros. Para tanto, foi realizada uma pesquisa descritiva, de caráter documental e com abordagem quantitativa. Os dados utilizados neste estudo dizem respeito a informações referentes à captação de recursos e renda nas bilheterias de 666 filmes nacionais lançados entre os anos de 1995 e 2012, ao passo que a análise estatística empregada foi o coeficiente de correlação de Spearman. Os resultados evidenciaram que existe uma forte correlação positiva entre as duas variáveis analisadas, revelando uma tendência dos filmes com alta captação de recursos serem os que registram as maiores arrecadações nas bilheterias. A análise dos dados revelou ainda que há uma concentração tanto de recursos incentivados (61%) quanto de renda nas bilheterias (75%) em filmes com volume de captação superior a R$ 3 milhões." (Santos Jr; Gomes, 2015, p. 24)

SANTOS JÚNIOR, I. A. N. dos; GOMES, D. A. S. Cinema Brasileiro: Um Estudo Comparativo entre a Captação de Recursos Mediante Mecanismos de Incentivo Público versus a Arrecadação nas Bilheterias Nacionais. Sociedade, Contabilidade e Gestão, v. 9, n. 3, 2014.